Com Busan também se luta pela paz

Com Busan também se luta pela paz - Artigo de Opiniao - Vitalino Canas - VCA

Não é de hoje que decisões que parecem ter um cunho essencialmente económico, promocional ou turístico, se revestem afinal de profundo relevo político. Em novembro deste ano, o Bureau International des Expositions irá definir onde se realiza a World Expo de 2030, elegendo uma das três candidaturas pré-selecionadas. Busan, cidade do sul da Península da Coreia, é uma das candidatas. Portugal, como todos os demais membros, dispõe de um voto. Como Estado respeitado na comunidade internacional e cujas posições são ponderadas por outros Estados, trata-se de um voto importante.

 

Não se trata de um assunto muito versado na comunicação social, nem acompanhado pelo grande público, mas importa deixar algumas reflexões relevantes sobre as escolhas que o Bureau International des Expositions irá realizar.

 

Num Mundo em acelerada transformação, em que alguns Estados pretendem uma revisão radical da ordem internacional e algumas regras e princípios que se julgava bem estabelecidos são colocados em dúvida, a República da Coreia fez – ou manteve – as suas próprias escolhas. Vê-se a si própria como um Global Pivotal State: um Estado que contribui para a liberdade global, para a paz e a prosperidade da comunidade internacional e que salvaguarda a ordem internacional baseada no Direito. Situada
numa zona do Globo relativamente periférica em relação à prática da democracia, da liberdade e do respeito pelos direitos humanos, a República da Coreia assume e quer reforçar a sua responsabilidade de contribuir para a consolidação desses valores.

 

Nesse contexto, além da preservação das suas alianças tradicionais, designadamente com os EUA, a República da Coreia tem desenvolvido um esforço de aproximação com a Europa, que se acentuou nos últimos anos. Esse esforço de aproximação reflete-se, por exemplo, na grande similitude da visão em relação à guerra da Ucrânia. Em termos mais concretos, esse esforço manifestou-se na candidatura de Seul à realização das Jornadas Mundiais da Juventude em 2027. O Papa Francisco anunciou em Lisboa, há poucos dias, que essa candidatura foi aceite. A República da Coreia, onde a percentagem de católicos não é muito elevada, embora significativa (cerca de 11%, acima de cinco milhões de pessoas), demonstra a sua abertura e a vontade de apoiar eventos socialmente valiosos, que mobilizem os jovens para os desafios de um futuro cheio de riscos para a humanidade, mas também pleno de oportunidades.

 

Portugal tem sido um dos Países que responsáveis políticos e investidores coreanos têm privilegiado no processo de maior envolvimento da República da Coreia nas economias europeias. Grandes empresas coreanas estão a investir em setores
estratégicos, como o das energias renováveis e em unidades industriais. Outros investimentos, que acentuarão o impacto económico, estão a ser ponderados por grandes grupos. A recente visita do Primeiro Ministro António Costa à República da
Coreia constituiu um passo determinante.

 

Busan, só por si, tem argumentos mais que suficientes para ser objeto da preferência da comunidade internacional.

Certamente que compete com duas outras grandes cidades, com história e prestígio. Todavia, Busan, com os seus três milhões e meio de habitantes, a segunda maior da República da Coreia, é uma metrópole dos tempos modernos, com registos históricos que recuam ao século IV, que concilia uma atividade económica vibrante em torno do seu porto, o sexto mais movimentado do Mundo, com monumentalidade, cultura, laser e cosmopolitismo.

 

O título deste texto não constitui apenas um apelo aos protagonistas do presente. É também uma referência ao passado de Busan. Foi para lá que se transferiu a capital durante a Guerra da Coreia, iniciada em 1950, nela se instalando os principais órgãos de governo, bem como um milhão de refugiados. Durante algum tempo, Busan foi o último reduto da liberdade, o derradeiro suspiro da resistência da República da Coreia, baluarte da luta pelo regresso da paz. O Cemitério Memorial das Nações Unidas, lá implantado, único no Mundo, testemunha o sacrifício de muitas nacionalidades.

Busan é também um dos segredos do milagre económico em que se transformou a República da Coreia.

A acrescer aos argumentos próprios de Busan, avultam outros de mais longo alcance. A aceitação da candidatura da República da Coreia com o apoio, entre outros, de Estados europeus, será interpretada como um sinal de coesão de uma coligação de Estados like minded de dimensão universal. Decerto que está também sobre a mesa dos decisores a candidatura de uma cidade europeia, mas o apoio a tal candidatura pelos Estados europeus, embora compreensível, não tem a mesma mais-valia simbólica e política que o apoio a Busan. E neste momento histórico, esses sinais são valiosos, produzem impacto nos inimigos da liberdade e impressionam favoravelmente os hesitantes.

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